Mariana Salomão Carrara
Quando permito que os delírios dela
provoquem sigilosos princípios de conjecturas em mim, fica a imagem absurda: eu
com parafernálias de bebê, e um bebê, chegando de volta da maternidade ao
apartamentinho avermelhado e infestado de poeira, figurinos, uísques e artistas
– rapidamente substituídos e afastados por parentes cheios de autoridade –, um
bebê ali parado embrulhado no meu braço, num dia totalmente irreversível como
nenhum outro, o bebê reordenando as prioridades e subitamente transformando
qualquer vocação ou arte em supérfluo, o bebê no braço pesando cada vez mais,
até que não caiba no berço, nem caiba na minha vida, onde nunca de fato teria
cabido, uma pessoa que eu teria posto no mundo e que pouco a pouco poderia
fazer cada vez menos sentido. Alguém, na pior das hipóteses um homem, que nada
tem a ver comigo e de quem eu não posso me separar jamais. Um outro homem que
talvez por freudialidades revoltantes tenha se formado ao avesso de mim e se
sente à minha mesa com a barba impecável
exercendo suas boçalidades tipicamente masculinas, repletas de uma
heterossexualidade das mais triviais, apresentando mulheres conformadas e
plácidas com quem o meu convívio começa a ser permanente. Circularia em casal
pela minha sala exercendo sua jovialidade plástica, exibindo músculos que eu
nunca tive, julgando-se ele próprio o retrato de uma nostalgia que eu
terminantemente não teria. Tentativas inócuas de me magoar com a minha velhice
enquanto na verdade me enoja com a sua juventude de banalidades, escancarando
ao mundo que não pode haver nada de especial em mim se o que eu pude gerar é um
cuspe amorfo da mediocridade, ele ali feito um espelho eterno que eu passaria a
vida tentando negar.
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